Muito lutei para conseguir tirar você daqui. Muitas noites
vieram acompanhadas de choro e de ódio, por estar presa entre duas paredes que
só iriam parar de me apertar quando eu decidisse se valia a pena ou não deixar
você ficar. Eu sempre fui do tipo que vai até o fim e faz o imenso e solitário
calculo: somar o que teve de bom, diminuir o que teve de ruim. Não deixar
duvida, insistir em construir com os melhores materiais em alicerces duvidosos.
Pagar pra ver, dar a cara à tapa, sempre combinou comigo. Depois, se desse
errado, eu me reconstruía. E ainda saía feliz por saber que eu era parte de uma
(pequena?) parcela da humanidade que realmente tentava. Nunca quis ser digna de
pena e muito menos escrava dos “E se” que a vida impõe e, de fato, nunca fui.
Falando de maneira geral, as pessoas desistem antes de me cansarem e isso até
que é bom. Só que dessa vez, não foi assim. Eu que sempre fui tão cheia de
palavras que saltavam da boca sem meu consentimento, fiquei quieta e nem foi
por não ter o que dizer, eu tinha e tinha muito. Mas simplesmente não valia
mais. O dia que minha tolerância esgotou talvez tenha sido o dia mais triste de
todos os meus dias, dos nossos dias. Pequei pelo excesso, por tudo isso que transborda de mim. Por deixar tanta coisa relevante passar, virei boba. Por deixar a
vontade de ter os outros ser maior que a vontade de ter a mim, acabei sem
dormir por vários dias. Achando muito bonita toda essa história de insistir até
esgotar, só eu que não vi o quanto fiquei tola. No dia mais triste de todos os
meus dias, não sabia te explicar porque tinha acabado. Não que faltasse motivo,
mas o descaso chegou de uma forma que tive preguiça até de explicar. Nem dei atenção pelo seu interesse súbito em
mim, considerando que já palestrei tantas vezes o mesmo discurso quando achava
que valia a pena e nunca fui ouvida. Criei vergonha na cara, coragem ou seja lá
o que for e joguei longe meu nariz de palhaça, consciente das conseqüências. Agora
é assim, não me estico mais. Vou até onde o braço alcança. Se não gostou, pode
ir embora.
Mania de escrever
Sempre ouvi a mesma coisa: Essa menina não consegue guardar nada na cabeça por causa dessa mania de escrever.
terça-feira, 30 de julho de 2013
domingo, 7 de julho de 2013
Des(conhecidos)
Vou te pedir uma coisa, ta? Tá. Não escreve sobre mim. Por
quê? Porque quando você escreve deixa tudo tão profundo e louco e eu não quero ser
isso. Isso o que? Profundo, louco. Não to entendendo o que quer dizer. Não sou tudo isso. Mas quando eu escrevo pode
ser o que eu quiser. Não, como é aquela frase bem clichê? Não sei. Aquela.
Qual? Você é a escritora maluca aqui. Mas não sei. Quem se define se limita, é
isso, você escrevendo sobre mim me limitaria como o carinha que você sai de vez
em quando. E daí? E daí que não sou só isso. Na minha vida sim. Preciso ir
embora. Vai. Quer que eu vá? Você que sabe. Não precisamos de joguinhos. Talvez
eu precise. Aí vou ficar louco. Por quê? Porque era isso que eu gostava em nós
dois, não éramos complicados. Eu sempre fui. Agora eu sei, hoje abri o
computador e vi aquele texto seu. E ai? Fiquei com medo. Medo depois de tantos
anos? Você é meio perturbada. Então ta. Pra quem era o texto? Um carinha que eu
saía de vez em quando. Quem? Não era importante. Então ta bom. Para, já passou.
Porque escolheu se chamar de Bia? Porque sim. Bia não parece com você. Bia soa
bem aos meus ouvidos. Eu só conheci uma Bia, e ela era bem chata. Prefere o
que, então? Ana. Por quê? Desde quando você é tão perguntadora? Não sei, tô com fome. Tô assustado. Com o
que? Você, você me assusta. Para com isso, to aqui. Por isso mesmo, vou embora.
Calma aí. Eu tenho muito medo que você transforme nossos encontros de vez em
quando em um romance cheio de arco-íris e coisas bonitas e você sabe que eu não
estou disposto a entrar em um relacionamento agora e tem o trabalho e faculdade
e contas e outras coisas na minha vida. Tá. Não me olha assim. Tudo bem, eu não
iria mesmo escrever sobre você. Por quê? Porque só escrevo quando acaba. E
agora? Agora acabou.
domingo, 2 de junho de 2013
Mendigo
Tarde de domingo
chuvoso e você teve aquela coisa que você tem quando ta insatisfeito com algo.
Aquela coisa de fumar na janela escutando som alto. Mas com desprezo. Não
aquele desprezo de quem tenta ser superior, desprezo puro, daquele que não tem
o objetivo de atingir e atinge. Fiz um chá antes de tentar conversar. Depois
sentei no sofá e você perguntou se eu percebia. Só fiz que sim com a cabeça. No
seu som alto, Jim Morrison cantava docemente “lets swim to the moon, let’s
climb through the tide”. E você me olhou com aquela cara. A cara que você olha
pro mendigo na rua quando não tem dinheiro trocado pra ajudar e pro cachorro
que você não pode levar pra casa. Puta merda, eu tanto te pedi: Não me olha com
aquela cara! E na hora de ir embora você decidiu usar logo essa cara. Com
tantas caras que eu amo ver e com tantas caras que podem vir acompanhadas de
qualquer palavra que eu perdôo porque são caras que adoçam minha estadia no
mundo. Você escolheu a cara de culpa e compaixão e com a boca meio torta. E
doeu tanto. E falou que eu precisava entender que sua cabeça é complicada e
hoje você ta afim e amanhã não sabe mais e você bem que me avisou que ia ser
assim e eu concordei mas eu só concordei porque sou teimosa e insisto em tentar
mudar verdades absolutas do mundo porque não aceito que alguém tenha verdades
absolutas que não consigo ter. E continuava, falando: Ana, você é tão estranha.
E você também é estranho. Você é magro demais e fuma muito e organiza as meias
por cor e não escorre macarrão e não gosta de Caetano. Se você não tem dinheiro
pouco pra dar pro mendigo não consegue dar o dinheiro grande. Porra, eu sou o
mendigo. Se você realmente se importasse com o mendigo largava mão do seu luxo
e dava esse dinheiro pra ele. A culpa não é minha por ser mendigo e aceitar
pouco. Se o fato de eu aceitar pouco incomoda, então me dá muito. Não, eu não
quis dizer isso. Não olha assim de novo. Não vai embora assim correndo. Eu sei
que você tem vontade de sair correndo, mas não vai. Aprende que eu te amo de
verdade e por isso sou mendigo. E me sento bem pequenininha no sofá para você
caber e tomo banho rápido para você usar o banheiro e não gasto mais com
maquiagem porque você é tão mais importante e agora você me diz que isso é
justamente o problema que o fato de eu ser tão mendigo te incomoda. E eu fiz
tudo por você. E você vai embora com uma cara de quem quer pedir desculpas por
não se encaixar e continua tão maravilhoso com a jaqueta de couro que sua mãe
te deu ano passado e você nunca mais volta. E eu continuo mendigando pedaços
seus pela casa porque quando você ria e quando você vinha e quando você dormia
eu era feliz.
terça-feira, 28 de maio de 2013
O gosto bom que você tem
Acostumada a ter o autocontrole enfiado goela abaixo, a
menina dos escudos. Cada gesto sempre foi friamente calculado. Não vou ligar.
Não faz diferença. Vou fingir que nem vi e que não estou calculando mentalmente
em quantos dias é normal sentir saudade. Não tem porque sentir saudade antes do
prazo. Nem tem porque sentir saudade.
Com um copo de vodka na mão, soube por muito tempo gritar “eu não tô
valendo nada”. O vazio pós festa era preenchido por um carinha qualquer que
ocupava meu tempo e minha cama e meu tédio e prometia ligar enquanto eu
esperava mais, desesperava mais. Sempre fui acostumada a ser decepcionada e não
surpreendida.
Aí, aparece você. Que acha que esperar pra ligar e pra me
ver é perda de tempo e você tem muito medo de perder tempo e ficar velho e
cheio de rugas e sozinho. Que acha que se amanhã a gente tiver afim de casar,
tudo bem porque nem sabemos o que pode acontecer depois de amanhã. Você não
calcula. Não se protege e olha pros meus escudos como um cachorrinho inocente
que não entende essas sujeiras humanas. E diz que tudo bem se eu surtar e ligar
no meio da noite e você precisar me buscar pra ficar na sua casa pois tenho
muito medo de pensar quando estou sozinha. E chega e ocupa bem mais que a minha
cama, mas não me invade. Me pego sorrindo sem medo. Sem medo de que você queira
sair correndo porque tô sorrindo apaixonada. E olho no fundo dos seus olhos por
longos segundos depois que a gente acorda e você não tem medo também, não me
acha estranha e nem desvia o olhar. E diz que tudo bem se eu quiser escrever
sobre você. E tudo bem se eu me assustar e precisar descansar de você. E então
eu vou pra casa e tudo la é você, o sofá que eu deito pra ganhar cafuné, o
avental que diz ‘diva’ e você usa e continua tão másculo, o espelho que você
usou pra me mostrar o quanto eu era linda mesmo de ressaca. Eu deito na cama
que é você também e acho mesmo que eu te amo. Mas um amor diferente. Todos os
meus amores são tão cheios de jogos e de inseguranças e você parece uma casa
quentinha que eu posso finalmente ir depois de toda uma vida conturbada sem
saber a que eu pertencia. Eu pertenço ao queixo quadrado e a barba por fazer e
aos seus cachos e as suas mãos e ao seu apartamento pequeno e ao seu peito. Eu
quero pertencer. Porque você diz que eu posso escolher o filme. Porque você
também sabe me tirar o ar. Porque você prefere ficar em casa no quentinho.
Porque você me deixa ser. Porque você sempre lê o modo de usar de tudo. Porque
você me protege das coisas feias. E você fica. E você cozinha. E você tem um
jeito meio francês e quando eu falo isso você sempre acha que estou dizendo que
você é meio gay e você nem se importa. E você pergunta como foi meu dia. E
consegue me amar com todas as minhas neuras. E nos dias que tenho as minhas
recaídas na depressão. E me diz que se eu quiser um cachorro mas me achar
inconstante demais pra cuidar dele, você cuida pra mim. E me abraça e diz que
vai ficar tudo bem. E eu sei que vai. Porque eu sei que você fica.
domingo, 26 de maio de 2013
Medo
Eu não entendia porque toda vez que você decidia bancar o esperto
e trapacear em jogos eu ficava tão neurótica. É só um jogo, você dizia rindo, você
tem que parar de fazer tempestade em um copo d’agua, enquanto me abraçava e
fazia gestos imitando os meus, e dizia o quanto eu era exagerada e estranha e
italiana por gesticular tanto. Você não fazia uma análise profunda de tudo que
eu dizia, até porque era um ser humano normal e seguro. E eu encostava a cabeça
no seu ombro e o nariz atrás da sua orelha e ficava calma porque aquele cheiro
era tão bom e trazia esperança e vontade de sentir todos os seus cheiros que me
faziam esquecer os jogos, o trabalho, o metrô lotado e a minha receita médica
que dizia que eu só conseguiria ser feliz tomando Cloridrato de Fluoxetina todos os dias após o café. E minha
mãe e minhas amigas e os outdoors e o mundo e você me dizendo menina, dessa vez
vai devagar, não seja uma tempestade em um copo d’agua. Enquanto eu também tentava
me convencer a ser leve, conta-gotas, ir com calma porque afinal nem nos
conhecemos tão bem pra eu ser tempestade. Mas era tão simples. Meu medo
era de ser o jogo que você engana tão friamente e sorri achando que é só um
jogo. E imita, tira sarro e depois esquece porque é só um jogo. Então um dia
decide do nada pular uma fase e deixar assim, incompleto porque você não tem
paciência de passar. Meu desespero e meus gestos italianos que você sempre
achou uma graça eram pra dizer: eu sou o jogo! Sou difícil às vezes.
Implicante. Mas eu tô aqui. Mesmo sendo longa e um quebra-cabeça em algumas
fases chatas e sendo tão curta em outras que você adora. Então eu comecei a
chorar enquanto você fumava horas depois, e mesmo sem te dizer nada você falou
da forma mais verdadeira e subentendida ao mesmo tempo, baixinho assim: Bia,
não vou mais trapacear no jogo. Nem pular fases? Não. Promete? Sim, prometo.
Pronto.
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